terça-feira, 3 de abril de 2007

Vrido

Segunda-feira me deparei com uma grande dificuldade na "mediação de leitura" na creche. Agora o trabalho se concentra em três crianças por vez, de preferência que não saibam ler nada. Enquanto conto estórias, as meninas, mais interessadas na companhia do que se passava no código na frente das imagens, iam contando sobre suas vidas que lembrassem figuras dos livros.
Foi assim que a pequena Viviane, com um grande corte no ombro, depois de me pergunta se eu já tinha sido cortada, contou que ela tinha, e foi por vrido. Achei que fosse pelo Vitor. Vitor? -Não, duas repetiram, vrido! Frito? Nãaao, vrido!
A menina se recusou a aceitar que na verdade o que deixou a enorme cicatriz em seu ombro era um vidro, e que vrido não existia. Passei quinze minutos fazendo com que fizessem o som: dru dru dru dru dru, mas a menina do corte não quis por timidez. A outra seguiu meu método e aprendeu, mas Viviane, mesmo após repetir incontáveis vezes depois de mim: Vi -vi Dro- dro, não conseguiu aprender a palavra.
Não é a primeira vez que ouço erros desse tipo, mas toda vez eles me chocam, já que vidro é muito mais fácil de dizer que vrido e não parece ser um problema de mera ignorância, paesar de acontecer com pessoas sem acesso à educação adequada.
Como corrigir erros se eles aprendem a falar na convivência? Será que quando as crianças aprenderem como se escreve vidro, continuarnao a falar errado? A menina mais nova das tries, Vitória, falava perfeitamente e corrigia as outras, que apesar de ouvirem vidro, repetiam vrido. Existe uma parede de vrido na comunicação entre diferentes classes? O espelho d´água parece esconder águas muito mais profundas, será que o reflexo da luz chega até lá?

3 comentários:

Bianca Hayashi disse...

Isso me lembra a maioria das mulheres que arrumava a casa aqui. Todas elas falavam que queriam "esmagrecer" e eu, na inocência dos sete anos, não entendia o que elas queriam dizer com isso.

Mesmo sabendo o correto, acho que é mais fácil falar da maneira como ouvimos cotidianamente mesmo.

Beijos!

Paula Miguel disse...

Eu nunca entendi como as pessoas conseguem falar "mendingo", "mortandela", "vrido", "estrombo" e similares ao invés das palavras originais. Poxa, o português é bem mais fácil do que isso!
Esse país precisa de muito mais que apenas Educação; e tínhamos que começar com o presidente. ¬¬

Beijo, Má! =]

Gisele Brito disse...

Bom, eu tenho, digamos, algumas ligações emocionais com palavras pronunciadas de maneira "errada", Primeiro porque eu gaguejo.(Mas apesar disso eu sei falar a palavra "seguinte" ao contrário do que as pessoas acham, conforme descobri recentemente). Segundo, porque meus avós tem formação oral, lá do interior da bahia e rezam em nome do "padi", do filho e do espiríto santo. Amém.
Eu tenho uma tia Benedita e quando pequena não sabia dizer assim com todas as sílabas, aí a chamava de Bidita. Chamava e ainda chamo, apesar de saber di-rei-ti-nho como se diz.