segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Por quem os sinos dobram?

Mil carros na Rebouças, e motoboys passando à toda velocidade. Mas minha mente divaga por outro lugares e começo a lembrar de um passado que eu não vivi e uma história que não aconteceu. Já fazem duas semanas que terminei "Por quem os sinos dobram", mas aquela história de amor passada na guerra civil espanhola badala alto na minha cabeça, como se eu estivesse lá.
O livro narra quatro dias na vida de Robert Jordan, um jovem oficial que tem a missão de explodir uma ponte para uma ofensiva do exército republicano e assim se envolve com os guerrilheiros.
Logo no primeiro dia, esse homem que não tinha idéia do que era o amor, sente a terra tremer pela simples moça de cabelo raspado, Maria. É a partir daí que vem um dos conceitos muito interessantes do livro, em que só sentimos a terra tremer por alguém três vezes na vida, sendo que já é muita sorte se algum dia tremer na vida. Em uma época como a nossa, em que o amor foi tão banalizado, é bom lembrar que grandes amores não acontecem todo dia. Eu mesma, só senti a terra tremer uma vez, há muito tempo.
Enquanto a mente Robert Jordan faz planos de levá-la com ele a Madri depois do ataque, ele percebe que as chances dele morrer na ofensiva são grandes. E ele entra em um grande paradoxo de medo e coragem.
Não é só no que concerne ao amor que a história nos faz perceber o quanto banalizamos as coisas, e sobretudo o tempo. Ao mesmo tempo, Robert Jordan tem que lidar com os outros guerrilheiros, como o velho, que apesar de ser um caçador, não gosta de matar homens. Ou Pablo, que já torturou diversos líderes fascistas, mas ficou covarde e decide que explodir a ponte é uma má idéia. Outra personagem central é sua mulher durona, que toma as rédeas do grupo em nome da república. Sem maniqueísmos, os personagens se apresentam, acima de tudo, muito humanos e provocam todo o tipo de questionamento e análise por parte de Robert Jordan. Se o seu marido resolve se rebelar e estragar a missão, deve-se agir com condescendência? Matá-lo? Se seus amigos estão sofrendo um ataque, como entender que de nada adiantará ir em seu socorro? E se você está ferido e o inimigo se aproxima, você abriria mão da fuga para salvar seu amor? Além dessas perguntas, e muita indignação, estupefação com uma história tão marcante e cheia de nuances, Hemingway suscitou mais outras trezentas, e algumas que eu ainda nem achei palavras pra expressar. Acho que a razão pela qual eu nunca li muitos livros de guerra foi porque as cenas eram abstratas e ainda assim sangrentas. Nunca foi assim, como se eu visse e sentisse toda a dor, a raiva, o medo inflingido por um exército.
Mais um motoboy passa zunindo na minha janela. E sem remorsos, penso que sua morte seria nada perto das mortes daqueles que lutaram por uma causa, daqueles personagens fictícios tão reais que eu sinto o luto, badalando forte em mim. Por quem os sinos dobram?

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